18/04/18 11h56

Crédito cooperativo cresce 15% em 2017

Valor Econômico

Enquanto o crédito bancário encolheu no ano passado pelo terceiro ano seguido em termos reais, os empréstimos nas cooperativas tiveram expansão de 15% em 2017, para R$ 92,5 bilhões. O segmento terminou o ano passado com 9,2 milhões de associados, 5,8 mil pontos de atendimento - maior que a rede do Banco do Brasil, com 4,8 mil -, e uma fatia de 4,6% dos depósitos do Sistema Financeiro Nacional (SFN), ou R$ 129 bilhões.

Entre as razões para a expansão do cooperativismo estão a melhora na segurança, depois da instituição do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop), o aumento da governança e a maior competitividade em taxas e tarifas em relação aos bancos tradicionais. Além disso, o movimento de desbancarização e o surgimento de "fintechs" também favoreceram os bancos cooperativos, em que o lucro é devolvido ao cliente, na medida do uso dos serviços. O próprio presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, tem citado o estímulo às cooperativas e bancos menores como forma de incentivar a concorrência no setor.

A meta das cooperativas é disputar espaço com os grandes bancos e chegar a 10% de participação de mercado até 2025. No fim de 2017, o setor tinha uma fatia de 3,27% no crédito.

Apesar do crescimento contínuo nos últimos anos, a participação ainda é muito pequena quando comparada com economias maduras da Europa Ocidental e da América do Norte. Na França e na Alemanha, por exemplo, as cooperativas participam com 60% e 20%, respectivamente, dos depósitos totais. Nos EUA, onde o cooperativismo virou bandeira de movimentos como o "Occupy Wall Street", de protesto contra os grandes bancos, atinge 33%.

No Brasil, a região Sul lidera com participação de 17,2% das cooperativas nos depósitos -sendo 28,7% em Santa Catarina- devido à forte presença do agronegócio. A carteira de crédito está concentrada nas pessoas físicas, que representam dois terços do total. As principais modalidades são financiamentos rurais e agroindustriais, além de empréstimos pessoais com e sem consignação em folha. As operações voltadas a pessoas jurídicas concentram-se em empréstimos para capital de giro.

Atualmente o Brasil tem cerca de mil cooperativas de crédito e quatro confederações: Cresol, Unicred, Sicredi e Sicoob, sendo que as duas últimas são as únicas que possuem bancos. A maior parte dos pontos de atendimento fica nas regiões Sul (45% do total) e Sudeste (36%).

Para João Tavares, presidente-executivo do Banco Cooperativo Sicredi, um dos apelos das cooperativas é ter custo mais baixo, porém com experiência e um atendimento mais próximo. Ele afirma que o Sicredi cresce a uma taxa anual de quase 20%. "Com a crise, a maioria dos bancos puxou o freio de mão, mas nossa atividade é dentro da comunidade, que não parou por causa da crise mundial", disse.

Segundo Lucio César de Faria, diretor-executivo do FGCoop, o sistema de cooperativas ganhou confiança nos últimos anos ao melhorar a governança, após a exigência do BC de profissionalização das diretorias, além da criação do próprio fundo garantidor, com a possibilidade de indenização em caso de quebra de uma cooperativa. "Sem dúvida, igualou as condições de competitividade com o sistema bancário comercial. Inclusive, até o valor da indenização é igual: R$ 250 mil por CPF e CNPJ."

Na avaliação de Marco Aurélio Almada, presidente do Bancoob (do sistema Sicoob), ao atingir o patamar de 10% dos depósitos do sistema a atuação das cooperativas de crédito "mudaria de patamar". "Nós passaríamos a ser um ator que ainda trabalha em 'gaps' do sistema, mas ajuda a regular e melhorar a justiça financeira na relação com os clientes." Ele aponta que a expansão acelerada do setor não é um "voo de galinha" e vem acontecendo de maneira sólida.

O executivo do Sicredi afirma que, ao ter um relacionamento mais próximo com o cliente e a comunidade em que estão inseridos, os bancos cooperativos conseguem mensurar melhor os riscos e isso os ajuda a ter uma inadimplência que é quase a metade do sistema. Entretanto, também significa um custo operacional maior. O índice de eficiência é superior a 60% (quanto menor o percentual, melhor), enquanto nos grandes bancos fica perto de 40%. Por essa razão, nos últimos anos o setor tem investido pesado em tecnologia e automatização de processos.

Mesmo assim, o Sicredi não pensa em reduzir o número de agências, como tem ocorrido com os bancos tradicionais. "Vai chegar o dia em que as transações financeiras serão commoditizadas. O diferencial competitivo não será o empréstimo, mas sim o relacionamento com as pessoas", aponta Tavares.

Operações liberadas pelas cooperativas representam 3,3% do SFN e somam R$ 92,5 bilhões

Almada, do Bancoob, lembra que, com a consolidação dos bancos estaduais nos anos 1990, criou-se um déficit de agências em cidades pequenas do interior, que vem sendo suprido pelos bancos cooperativos. "Nós abrimos 160 agências no ano passado. Já temos presença em todos os Estados há alguns anos, mas nosso polo difusor é o Sudeste, Centro-Oeste e Santa Catarina."

A Unicred, terceira maior confederação do país, também tem planos de expandir sua rede de atendimento. Apesar de ser menor que Sicoob e Sicredi, a entidade conta com 240 agências em dez Estados, atendendo 200 mil clientes. Diferentemente das outras duas, que tiveram origem no crédito rural, a Unicred começou como uma cooperativa para médicos. "Queremos reforçar nosso conceito como uma marca 'premium'. Nosso tíquete médio é bem maior que em outras cooperativas, em torno de R$ 10 mil", afirma o executivo-chefe, Fernando Fagundes. Segundo ele, a confederação, que passou por um processo de encolhimento no começo da década, já voltou a crescer e tem capacidade para dobrar o número de cooperados.

Não é por apostar no contato mais próximo com o cliente, no entanto, que os bancos cooperativos não investem nos canais digitais. Segundo o presidente do Sicoob, hoje 71% das transações já são feitas dessa forma. Já Tavares, do Sicred, conta que o sistema deve lançar seu banco digital, batizado de Woop, em maio.

Em relação ao crédito em si, o Sicredi tem uma carteira de R$ 43,891 bilhões, enquanto a carteira do Sicoob soma R$ 42,865 bilhões. Em geral, dois terços são destinados a pessoa física e o restante para pessoa jurídica. A atuação com empresas é mais recente e a perspectiva é de crescimento, até mesmo em função da entrada no mercado de credenciamento de lojistas para pagamento com cartões, que impulsiona as operações de antecipação de recebíveis.

"Entramos nesse mercado há três anos e já temos 200 mil usuários das máquinas Sipag. Estamos crescendo a taxas muitos expressivas", conta Almada, do Sicoob. "Nós lançamos nossa maquinha em novembro do ano passado e temos mais de 20 mil clientes. O resultado é impressionante, estamos tendo problemas bons [para atender toda a demanda]", comenta Tavares, do Sicredi.

O Sicoob teve lucro - chamado de "sobras líquidas" nos bancos cooperativos - de R$ 2,783 bilhões no ano passado. Já o Sicredi registrou lucro de R$ 2,346 bilhões. No Sicoob o dinheiro é inteiramente devolvido aos cooperados, enquanto no Banco Sicredi o lucro é dividido com o Rabobank, banco cooperativo holandês que tem uma fatia de 23,97% no brasileiro. Além disso, a International Finance Corporation (IFC), membro do Banco Mundial, tem uma participação de 3,15%.

"Quando fizemos o acordo com o Rabobank, em 2011, era importante trazer o 'expertise' de um banco mundial de primeira linha. Eles nos ajudaram em processos, governança, tecnologia. O IFC também trouxe muito avanço, qualificou a gestão", comenta Tavares. Segundo ele, a ideia é manter a parceria com o banco holandês, mas é possível que a participação do Rabobank seja gradualmente diluída nos próximos anos.

O setor demanda agora um papel maior na distribuição de recursos de fundos constitucionais, como FNE (Fundo do Nordeste) e FCO (Centro-Oeste), que hoje estão a cargo dos bancos públicos. "Podemos atuar como agentes pulverizadores desses recursos. O cooperativismo poderia auxiliar os bancos administradores a levar esse dinheiro a quem precisa, que são os microempreendedores", disse Thiago Abrantes, coordenador de crédito do Sistema OCB.