16/01/20 13h30

Empreendedores de Parelheiros profissionalizam negócios com programa de gestão

A realidade de um grupo de empreendedores de Parelheiros começou a mudar a partir de uma iniciativa do Escritório Regional Capital Sul do Sebrae-SP

Pequenas Empresas e Grandes Negócios

Parelheiros está a 35 quilômetros em linha reta do marco zero no centro de São Paulo, na Praça da Sé. Localizado no extremo sul da Capital, é o maior dos 32 distritos da cidade em território e também o menos populoso. O distanciamento geográfico deixa a região com cara de cidade do interior. As áreas agrícolas do entorno e a circulação de carroças e cavalos ajudam a reforçar o clima rural.

Mas o distrito também possui uma considerável atividade comercial e de serviços, seja como parte da rota ecoturística, já que é uma área de trilhas e cachoeiras, seja no centro do bairro de 140 mil habitantes. Por estarem tão distantes do coração da metrópole, os empresários da região acabavam ficando fora do radar, como em um mercado à parte. Vocações locais, como o turismo e a produção de orgânicos, não eram trabalhadas em todo o seu potencial.

A realidade de um grupo de empreendedores de Parelheiros, porém, começou a mudar a partir de uma iniciativa do Escritório Regional Capital Sul do Sebrae-SP, que iniciou em agosto de 2019 um projeto multissetorial focado no desenvolvimento local com as pequenas empresas do distrito. Um levantamento feito com os empreendedores locais apontou que muitos ainda tinham dificuldades em relação à administração e ao planejamento das atividades empresariais.

O Restaurante da Marlene foi uma das 17 empresas participantes do projeto do Sebrae-SP na região. Foi lá que funcionou, também, a sala de aula para os módulos teóricos do projeto – uma vez que a distância para o escritório do Sebrae-SP, em Santo Amaro, inviabilizaria a participação de muitos empreendedores da região.

Para Kelly Pereira Francisco, que administra o estabelecimento junto com a mãe, a Marlene, o programa serviu como um “choque de realidade” sobre a administração do restaurante por quilo. “Não acreditei quando vi que trabalhava com um prejuízo tão grande”, conta Kelly.

O consultor de negócios do Sebrae-SP Felipe Chiconato, que está à frente do projeto na região, diz que não é possível generalizar, mas a maior parte das pequenas empresas – seja onde for – é desorganizada financeiramente e, entre as que possuem algum tipo de organização, poucas sabem interpretar as informações. “A desorganização financeira é um enorme problema, pois o empreendedor não tem clareza sobre como está a sua empresa, se ela dá lucro ou sobre o que precisa ser melhorado”, comenta.

O primeiro passo para começar a organizar as finanças, orienta o consultor, é entender que é preciso no mínimo seis controles financeiros: o registro de venda, o controle de caixa, contas a receber e a pagar, fluxo de caixa e demonstrativo de resultado (DRE). “Essa é a estrutura mínima de controle”, diz. Os módulos da primeira fase do programa incluem: gestão financeira, planejamento estratégico, marketing, gestão de pessoas, inovação e design thinking e acesso a mercados.

A primeira turma do projeto continua as atividades até o meio do ano. Em janeiro estão abertas as inscrições para a segunda turma, com início das atividades em fevereiro. No restaurante de Kelly, com 30 anos de história, um grande problema eram as dívidas, que pareciam só crescer, um problema crônico de déficit do caixa. “Pegava empréstimos sem saber o que realmente precisava. O caixa ficava negativo e não sabia o motivo”, lembra a empreendedora.

Com a dinâmica agitada do dia a dia de um restaurante por quilo, a organização da gestão ficou em segundo plano, com zero registro de vendas, sem controle dos gastos ou de quantos clientes passavam pelo estabelecimento diariamente, um controle feito no “olhômetro” ou baseado nos pratos sujos na pia.

“Os empréstimos e auxílios de crédito, como o cheque especial, estavam funcionando como medida emergencial, mas sem resolver, de fato, o problema nas contas da empresa. É como ter um furo na caixa d’água e ir colocando mais água para compensar a perda, mas sem consertar o furo”, explica Chiconato. Não à toa, o sentimento de Kelly era o de “trabalhar muito sem ver o resultado”.

Medidas como organizar a rotina de contas, reduzir custos, adequar os preços e até um novo processo de contratação que fosse mais assertivo foram mudanças de gestão que impactaram nos negócios em apenas três meses de projeto.

Entre setembro e outubro do ano passado, ainda no final da primeira fase do programa, as vendas cresceram 17% e o restaurante registrou lucro pela primeira vez em 2019. Mas uma das principais mudanças foi o de posicionamento no setor de alimentação, ao diferenciar seu serviço dando destaque aos produtos orgânicos – a região de Parelheiros é um polo de produção de alimentos orgânicos –, uma característica muito valorizada no mercado.

Sem "achismo"

Dono de duas unidades do empório Trem Mineiro, Emerson Domingues de Oliveira começou a participar do projeto com planos de abrir a terceira unidade do empório, mas, após a primeira fase do programa, entendeu que a melhor estratégia talvez seja justamente o movimento oposto: o de fechar uma das duas unidades e centrar esforços em apenas uma. “O ‘achômetro’ é a pior das ferramentas de gestão que existem. Com ferramentas como a DRE, por exemplo, conseguimos enxergar de forma muito diferente as contas”, diz Oliveira, que administra o negócio junto com uma sócia, Marlete Gonçalves Fermiano.

Da mesma forma que o Restaurante da Marlene, Oliveira e Marlete também passaram a posicionar melhor o diferencial do empório, o café mineiro com grãos selecionados. A lição de casa incluiu ainda organizar melhor a contabilidade da empresa e assumir a missão de reduzir custos e aumentar receitas.

Os próximos passos incluem investimento em marketing digital e o lançamento de um programa de assinaturas dos produtos do empório. “O programa traz para a realidade, faz repensar os conceitos e trabalhar de maneira mais profissional”, afirma o empreendedor.