26/02/18 13h30

Franceses esperam vender mais no Brasil em 2018

Valor Econômico

Empresários franceses no Brasil começam o ano otimistas com as perspectivas para o país. Dois terços deles esperam que 2018 seja melhor que o ano passado, mas a confiança é maior para o crescimento das vendas do que do investimento. Cerca de 24% planejam fazer fusões e aquisições este ano e 36% esperam aumentar o quadro de funcionários, após um 2017 que se mostrou melhor do que o esperado.

Os dados constam de estudo da Câmara de Comércio França-Brasil (CCIFB) em parceria com a Ipsos, divulgado com exclusividade ao Valor. A pesquisa ouviu 160 executivos, dos quais 63% presidentes e CEOs, entre novembro e dezembro do ano passado.

"A sensação que temos é de que chegamos ao fundo do poço e estamos começando a retomar o crescimento. Para nós, 2018 será o ano da retomada", diz Yves Besse, diretor de projetos para América Latina da Veolia Water Technologies, empresa especializada em gestão de água e resíduos para municípios e indústrias. A receita da companhia foi duramente afetada na crise, devido à situação fiscal do setor público e à parada nos investimentos pelo setor produtivo.

Para Thierry Fournier, presidente da CCIFB e da Saint-Gobain, fabricante de vidros e materiais de construção, o otimismo das associadas se deve a um aumento de demanda, que já é sentido pela maioria das empresas, apoiado na recuperação do consumo, melhora da confiança, além da inflação e juros baixos.

Na Saint-Gobain, por exemplo, a perspectiva é de crescimento do faturamento global de 6% a 7% em 2018, mais tímido para a construção civil (1% a 2%) e arrojado para o setor automotivo (até 20%). "O mercado da construção no Brasil caiu 20% em três, quatro anos, então uma retomada de 1% a 2% não é nada. É melhor do que continuar caindo, mas não é o momento de comemorar, é só uma inversão de tendência para preparar 2019, que deverá ser melhor, com o fim da incerteza política e a volta do investimento", afirma Fournier.

A fabricante de vidros planeja investir entre R$ 500 milhões e R$ 600 milhões este ano no Brasil, abaixo do R$ 1,3 bilhão de 2017, devido ao fim de um ciclo de aquisições. Os investimentos serão principalmente na modernização de linhas, o que não exige aumento de capacidade. A utilização da capacidade atual varia entre 70% e 80%, dependendo da linha, contra uma média histórica de 85%.

Entre as empresas ouvidas pelo estudo, 76% esperam vendas melhores ou muito melhores este ano. Com relação aos investimentos, o otimismo é um pouco mais modesto: 51% acreditam que os aportes vão melhorar em 2018. "As condições estão lá: juros e inflação baixos, o potencial de crescimento da economia, mas os investimentos ainda não se manifestaram, principalmente por conta das incertezas políticas e a respeito das reformas econômicas", diz o presidente da CCIFB.

A opinião do executivo se reflete naqueles que são considerados como os principais riscos para os negócios das empresas nos próximos seis meses. A relação de preocupações sofreu forte mudança ao longo das três pesquisas feitas com os associados da entidade, no segundo trimestre de 2016 e primeiro e segundo semestres do ano passado.

Na segunda metade de 2016, as maiores preocupações dos empresários eram a possibilidade de uma desaceleração da economia (56%), falta de demanda (55%) e dificuldade de repasse de preços (39%). Na sondagem mais recente, a incerteza eleitoral de 2018 (52%) e a não aprovação das reformas (33%) passaram à frente entre as dores de cabeça mais relevantes para os executivos.

"Sou francês e acostumado a olhar as coisas pela ótica do risco", afirma Philippe Jouvelot, presidente da AXA Seguros no Brasil. "O risco vem da incerteza, o que o investidor quer é ter um pouco de consistência na política", diz. Segundo ele, seria importante para o país reduzir a imprevisibilidade jurídica e trabalhar pela melhora de classificação pelas agências de rating. "Um país que tem uma nota que indica investimento arriscado nos obriga a colocar uma taxa de desconto na contabilidade dos investimentos maior do que deveria."

Para os empresários franceses, a mais importante das reformas é a tributária (65%), superando até a da Previdência (40%). "A reforma tributária é importante no curto e médio prazos, pois ajuda a melhorar o fluxo de caixa das empresas, simplificando as operações e dando mais espaço para investir. No médio e longo prazos, no entanto, a reforma da Previdência é ainda mais importante", avalia Fournier, da CCIFB.

A confiança dos executivos no governo federal caiu "drasticamente" de 2016 para 2017, aponta o estudo. Numa escala de zero a dez, o indicador recuou de 5,4, no segundo semestre de 2016, para 3,2 na primeira metade do ano passado, voltando ligeiramente a 3,7 ao fim de 2017. A equipe econômica do governo também foi afetada por essa perda de confiança, porém em menor proporção (de 6,5, a 5,8 e 5,7, nos mesmos períodos).

"Precisamos de legitimidade política, o que só virá com as eleições", opina Besse, da Veolia. "Temos um governo hoje que, apesar de ter legitimidade legal, tem uma ilegitimidade política. Não consegue governar por não ter legitimidade junto ao Congresso. Essa ilegitimidade está dividindo o país em dois e, enquanto estivermos divididos, vamos avançar a passos lentos."

Enquanto 44% das empresas avaliaram que 2016 foi um ano totalmente negativo, essa percepção caiu a 24% com relação a 2017. Ao mesmo tempo, a avaliação "regular" subiu de 29% a 42% e a totalmente positiva de 27% a 34% na passagem de um ano para outro.

Jouvelot, da Axa, está entre os poucos que viram o copo meio cheio durante a recessão. A companhia chegou ao Brasil em 2014 e seu faturamento ultrapassou o R$ 1 bilhão em 2017, com a contratação de mais de 600 pessoas neste intervalo. "A crise também oferece oportunidades. Ela trouxe juros elevados, o que para o setor financeiro, como bancos e seguradoras, é uma coisa boa. Os investimentos aproveitaram também o câmbio, favorável para nós, pois investimos em reais, mas nossa fonte é em euros."

Já para quem sofreu na crise, 2018 é ainda um ano de transição. "A menos que aconteça algo totalmente improvável nas eleições, que afete os mercados de maneira geral, o que não acredito, a partir de 2019 a retomada do crescimento será muito mais forte. Este ano é um período de transição entre o decréscimo e o crescimento forte da atividade", acredita Besse, da Veolia.