06/08/12 17h15

Indústria de automóvel com sotaque caipira em São Paulo

O Globo

No que é considerado o segundo grande ciclo de expansão da indústria automobilística brasileira, das cinco novas fábricas de automóveis em construção no país, três estarão no interior paulista, num raio de 70 a 150 quilômetros da capital. Estrategicamente localizadas no coração do principal mercado consumidor — o estado responde por 40% das vendas de veículos do país —, as novas unidades da coreana Hyundai, em Piracicaba, da japonesa Toyota, em Sorocaba, e da chinesa Chery, em Jacareí, consumirão investimentos de R$ 3 bilhões e terão capacidade de produção anual de até 500 mil carros em 2015, dependendo da evolução da demanda. As outras fábricas novas irão para o interior de Pernambuco e Resende, no Rio.
O atual movimento das montadoras rumo ao interior dá continuidade a um processo de descentralização da produção no estado, que tinha o ABC como polo principal. Na época, houve a abertura de novas fábricas por Volkswagen, no Paraná; Ford, na Bahia; e GM, no Rio Grande do Sul. Essa onda envolveu ainda a chegada ao país de marcas como a Toyota, que se instalou em Indaiatuba (SP); a Honda, em Sumaré (SP); a Peugeot Citroën, em Porto Real (RJ); e a Renault, em São José dos Pinhais (PR).

Estado ainda é um ‘hospedeiro natural’
As três fábricas em construção, combinadas com as plantas que já existem em Taubaté (Volkswagen), São José dos Campos (GM) e Campinas (Toyota, Honda e Mercedes), e com a cadeia de fornecedores que as acompanham, consolidam um novo polo automotivo no interior paulista. Só que com sotaque caipira.
Segundo a Anfavea, associação que representa as montadoras, dos 1,455 milhão de veículos produzidos em São Paulo (42,7% da produção nacional) no ano passado, 880,19 mil saíram das linhas de montagem do ABC, e os 574,8 mil restantes das plantas do interior. Com o início da produção da nova fábrica da Toyota, que será inaugurada na quinta-feira, dia 9, e da Hyundai, em novembro, 220 mil carros a mais passarão a ser produzidos no interior já em 2013. A partir de 2014, a produção do interior praticamente vai se emparelhar à do ABC. Em 2015, se o mercado continuar crescendo, o interior pode superar em 22% a produção do ABC.
— A saída das montadoras de São Paulo entre 1990 e 2000 foi incentivada pelo regime automotivo do governo FHC. A isso se somava certa exaustão do ABC pela inexistência de áreas que permitissem expansão das plantas — lembra Luiz Carlos Mello, diretor do Centro de Estudos Automotivos (CEA) e ex-presidente da Ford. — Mas a atração logística e econômica de São Paulo confirma a vocação de hospedeiro natural.

Mão de obra qualificada é diferencial
Em comum, os três projetos envolvem modelos compactos para concorrer em segmentos de grandes volumes de venda. A Hyundai, por exemplo, que já tem fábricas em Índia, China e Rússia, irá produzir o HB 20, modelo desenvolvido exclusivamente para o mercado local, com motores 1.0 e 1.6 flex.
— A produção em massa do HB 20 começa em 20 de setembro e as vendas, em outubro — diz Chang Kyun, presidente da Hyundai Brasil.
Serão criados 7.000 postos de trabalho diretos. Em Piracicaba estima-se em 20 mil os empregos indiretos trazidos pela Hyundai.
— Só isso já movimenta muitos recursos na cidade, mas haverá também um crescimento da arrecadação de ICMS, da ordem de R$ 25 milhões ao ano (10% do ICMS transferido anualmente pelo estado à cidade) — diz Barjas Negri, prefeito de Piracicaba, que doou o terreno de mais de um milhão de metros quadrados, área onde antes havia um canavial, para a empresa.
Em Sorocaba, o governo paulista construiu um viaduto sobre a rodovia Castelo Branco, para criar um retorno próximo à planta da Toyota, cujo complexo reunirá 12 outras empresas. A montadora japonesa inaugura a fábrica nesta semana, no dia 9, e os modelos Étios produzidos ali chegam ao mercado no mês que vem.
Sobre a volta da atratividade do estado, Luciano Almeida, presidente da Investe São Paulo, agência paulista de promoção de investimentos, diz que o peso da mão de obra nos custos dos veículos hoje gira entre 7% e 10%, o que demonstra uma exigência maior de especialização do trabalhador. Essa maior qualificação, combinada com a ampla cadeia de fornecedores já instalados na região tornam o interior atraente.
— Os índices de produtividade da mão de obra aqui chegam a ser de 20% a 30% maior, compensando a diferença salarial, que já não é mais tão grande em relação aos outros estados — diz Almeida.