19/09/12 13h55

Ingleses apostam na privatização

A Tribuna

A Inglaterra foi o primeiro país a entregar o setor portuário à iniciativa privada. Porém, faz um alerta para a dificuldade de integração. A privatização da gestão e da operação de portos garante uma maior agilidade administrativa aos complexos de cargas e facilita a realização de seus investimentos, mas também traz um risco. É a dificuldade de integração entre a entidade portuária privada e os órgãos e concessionárias responsáveis por seus acessos logísticos - rodovias, ferrovias e hidrovias.

A análise é de Richard Bird, diretor-executivo de The United Kingdom Major Ports Group Ltd (UKMPG), entidade que reúne companhias privadas administradoras de portos no Reino Unido, responsáveis por 70% do comércio internacional do país. Bird se reuniu no início da tarde de ontem, em Londres, capital da nação, com empresários e autoridades do Porto de Santos que realizam uma série de visitas técnicas aos complexos ingleses. As atividades integram a programação da 10ª edição do Santos Export - Fórum Internacional para a Expansão do Porto de Santos. Iniciativa do Sistema A Tribuna de Comunicação e uma realização da Una Marketing de Eventos, o seminário aconteceu nos últimos dias 13 e 14 de agosto, em Guarujá.

O debate sobre uma maior participação da iniciativa privada nos portos - especialmente em sua gestão - ganha uma nova importância neste momento, em que o Governo do Brasil estuda mudar as normas de exploração do setor. Uma das linhas de ação sob análise no Palácio do Planalto é a concessão de complexos marítimos e fluviais a empresas particulares.

Em sua apresentação, ocorrida no centro de convenções anexo ao Ministério de Comércio e Investimento do Reino Unido, Bird destacou que a privatização dos portos britânicos, iniciada em 1983, durante o governo da primeira-ministra Margaret Thatcher (que ocupou o cargo de 1979 a 1990), garantiu mudanças "significativas" para o setor. Entre elas, destacou a atração e o consequente aumento dos investimentos, a melhora da produtividade, a redução dos custos e a agilização da administração. "Tínhamos portos com graves problemas financeiros e o setor não atendia as demandas das indústrias, prejudicando as. Thatcher quis trazer (para os complexos portuários) os benefícios obtidos para o setor de aviação civil, que havia acabado de ser privatizado. E conseguiu. Os portos da Inglaterra deram um salto de qualidade, o que permite que hoje sejamos o país com o segundo maior mercado portuário da Europa, atrás apenas dos Países Baixos (onde está o complexo de Roterdã, o maior do continente)", explicou.

PRIMEIRA PRIVATIZAÇÃO. A Inglaterra foi o primeiro país do mundo a privatizar seu setor portuário, tornando-se uma referência da política liberal. Nos complexos sob controle privado, a empresa particular atua como operadora e também como autoridade portuária, sendo responsável pelos serviços de manutenção (dragagem, por exemplo) e pelos investimentos sem infraestrutura (construção de terminais). E essa missão é executada sem recursos públicos, lembra o diretor-executivo da UKMPG. "Não há motivo para o governo gastar com os portos se tem quem o faça. Isso agora é um papel das empresas, que buscam seus recursos no sistema financeiro. Assim, os recursos do país podem ser destinados a outros setores", afirmou o representante das administradoras portuárias privadas.

No Brasil, o Governo Federal realizou um processo de privatização do setor durante os anos 90, mas abriu para a iniciativa privada apenas a operação nos complexos. A administração continua sendo pública. Nos dois países, a fiscalização e a definição da legislação do setor são atribuições da União. Mas o cenário construído a partir da concessão dos portos às empresas privadas traz um risco, a falta de integração dos terminais como restante da infraestrutura de transportes do país, alerta Richard Bird.

Ele explica que uma das dificuldades enfrentadas pelas administrações particulares dos complexos é atuar em parceria com concessionárias e órgãos públicos que exploram rodovias e ferrovias, de modo que os acessos logísticos atendam as demandas do mercado portuário. "Demorou um tempo para que conseguíssemos integrar portos, estradas e ferrovias. Dover (porto que fica a 124 quilômetros a sudeste de Londres, às margens do Canal da Mancha), por exemplo, só conseguiu planejar seus acessos devidamente há sete anos", explicou o executivo. E complementou, mandando um recado às autoridades brasileiras: "Esse é um perigo que enfrentamos. Se o Brasil estuda ampliar a privatização agora, tem de evitar esse problema. É bom garantir que todos os participantes - portos, estradas, ferrovias, hidrovias atuem em parceria".

Ontem, além do encontro com Richard Bird, os integrantes da comitiva do Santos Export assistiram a apresentações de Philip Grindrod, responsável pelo setor de políticas portuárias do Departamento de Transportes do Reino Unido, e de Mark Wandless, presidente do conselho da Sociedade das Indústrias Marítimas (SMI, na sigla em inglês) do Reino Unido. Em seguida, no final da tarde, ainda no centro de convenções anexo ao Ministério de Comércio e Investimento, o diretor comercial e de Desenvolvimento da Codesp, Carlos Kopittke, e diretores de terminais de contêineres de Santos, participantes do grupo do Santos Export, apresentaram o complexo portuário santista, suas empresas e planos de investimento. Na plateia estavam empresários e autoridades britânicos.