04/10/13 15h35

Unicamp desenvolve etanol a partir do bagaço de laranja

Canal - Jornal da Bioenergia

Estudo feito na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) desenvolveu método capaz de produzir etanol de segunda geração a partir do bagaço da laranja. As pesquisas foram realizadas durante o doutorado da química paquistanesa Almas Taj Awan, sob orientação da professora Ljubica Tasic, no Laboratório de Química Biológica do IQ.

A citricultura é uma das mais destacadas agroindústrias brasileiras, o que pode ser comprovado ao observarmos os dados do Ministério da Agricultura. Segundo os números divulgados, o Brasil é responsável por 60% da produção mundial de suco de laranja e é, também, o campeão de exportações do produto.

O etanol de segunda geração é resultado da fermentação de monômeros de açúcar obtidos após hidrólise ácida ou enzimática. “Esse bioetanol resultante é destilado e analisado para testar sua pureza”, explica a pesquisadora Almas Taj Awan.

Método
O processo se inicia com a trituração do bagaço de laranja que, em seguida, sofre hidrólise, resultando numa solução açucarada fermentável. Foram utilizadas hidrólises ácidas e enzimáticas, realizando posteriormente fermentação com micro-organismos isolados ou misturados.

Entre as várias etapas que envolvem a conversão da ligninocelulose (polímeros que constituem a estrutura fibrosa dos vegetais) em etanol, distinguem-se a hidrólise da celulose para obtenção dos açúcares monômeros e a fermentação destes em etanol.

Durante o procedimento, compararam o processo clássico, que envolve hidrólise ácida, com os que utilizam a aplicação de enzimas comerciais e com os que introduziram o microrganismo Xanthomonas axonopodis pathovar citri (Xac). A inovação está no fato de que a Xac, de grande periculosidade por causar a doença do cancro em cítricos, foi escolhida devido à presença de várias enzimas hidrolases e, também, devido ao custo menor em relação às enzimas atualmente usadas nos processos industriais.

O próximo passo é fazer a fermentação e destilação do material, resultando, assim, no etanol de segunda geração. O tempo total do processo depende do tipo de hidrólise e tipo de levedura que são empregados para fazer fermentação. “As duas leveduras de Candida parapsilosis que foram isoladas no nosso grupo de pesquisa diminuíram o tempo de fermentação em até seis horas em relação ao tempo convencional, comparando com levedura comercial”.

Realidade
A pesquisadora Ljubica Tasic esclarece que a fabricação de etanol de primeira geração a partir do bagaço de laranja (fermentação de glicose e frutose do bagaço) já é uma realidade em pelo menos uma indústria de suco de laranja brasileira, a Citrosuco. “Acredito que uma adaptação do processo existente pode resultar na produção de etanol de segunda geração, o que aumentará significativamente a quantidade do etanol produzido a partir do bagaço de laranja que poderá abastecer postos de combustíveis brasileiros”. Ljubica acredita que, caso tudo ocorra como planejado, a produção do etanol-2G do bagaço de laranja poderá se tornar uma realidade em dois anos.

O Brasil, lembra a professora, é o maior produtor mundial de laranjas e do concentrado de suco e a coleta do fruto de laranja ocorre durante quase o ano todo, cerca de 9 a 10 meses. “Além dessa produção alta de laranja, o País precisa de um investimento relativamente baixo para que o processo de extração do suco de laranja seja mais verde e sustentável”. Ljubica firma que um melhor aproveitamento do bagaço de laranja, que apresenta 50% do fruto como matéria-prima nos processos de produção de álcool, extração do óleo essencial e geração de diferentes produtos de alto valor agregado, tais como pectina, proteínas, hesperidina, entre outros, poderá gerar novos empregos e aumentará a rentabilidade de indústria de suco.

A orientadora da tese afirma, ainda, que essa produção de etanol é viável economicamente e que, tecnicamente, é possível produzir etanol da primeira geração. “Um processo para produção de etanol de segunda geração também pode ser viável economicamente, introduzindo etapas de menor custo, em especial para hidrólise de celulose e outros biopolímeros de carboidratos, ou gerando de um novo produto cujo valor é alto, o que certamente abaixaria o custo de um litro de etanol produzido”, analisa.

De acordo com Almas, “normalmente, em indústrias de suco de laranja, o bagaço de laranja é utilizado para fazer pellets (alimentação para gado e outros animais), que são de baixo custo. Convertendo esse bagaço em 2-G etanol, ou extrair hesperidina, óleos essenciais e outros produtos valiosos podem tornar esse processo mais atraente em termos de economia”.

Economia
Apesar de já ser muito aproveitado na fabricação de rações, o resíduo do processo de produção de suco de laranja demanda um aproveitamento econômico mais atraente e de baixo custo. É isso o que se pretende com sua utilização na produção do bioetanol de segunda geração por meio da fermentação dos carboidratos oriundos dessa biomassa.

Os resultados obtidos pelas pesquisadoras mostram a ocorrência de bem sucedida conversão hidrolítica do bagaço em uma mistura de açúcares passíveis de fermentação. Nesse procedimento, os polissacarídeos do bagaço são convertidos por hidrólise em monossacarídeos. Esses açúcares foram então transformados em bioetanol com a utilização de leveduras, duas isoladas do bagaço e a convencional, tanto com um único microrganismo (mono-cultura) como com a cultura de dois microrganismos (co-cultura).

Os rendimentos em termos de bioetanol decorrentes do emprego de co-culturas chegaram a 60%, valor superior aos rendimentos decorrentes do uso de cepas específicas utilizadas na monocultura, que chegam a cerca de 30%. Além disso, os açúcares foram consumidos mais rapidamente, acelerando os processos fermentativos, que passaram a ser de seis horas e não mais de vinte e quatro horas, o que os faz atraentes em termos de custos e aplicações comerciais.

Considerando-se que, em 2011, no Brasil os resíduos de laranja chegaram a 9,5 milhões de toneladas (metade da massa da fruta produzida) e a possibilidade de um rendimento de cerca de 60% no processo empregado, conclui-se que esses resíduos poderiam ter gerado 1,14 milhões de toneladas de etanol.

Óleos essenciais
Durante os estudos, Almas Taj Awan também percebeu que seria interessante extrair os óleos essências da casca das laranjas. O produto apresenta ações antibacterianas e antimicrobianas e têm a função de proteger naturalmente o fruto contra pragas.

Por inibir as ações dos microrganismos, os óleos devem ser parcialmente eliminados. A extração dos óleos se dá pela passagem contínua do bagaço moído no vapor aquecido.

O resultado do processo pode ser utilizado como aditivo em indústria farmacêutica, indústria de cosméticos e em indústria de alimentos, o que impulsiona as pesquisadoras a pensar em formas mais eficazes de extração.